terça-feira, 25 de junho de 2013

AFETIVIDADE NA PRATICA PEDAGÓGICA

O afeto é um instrumento pedagógico que precede ao uso do giz e da lousa, todavia, não se tornou anacrônico. O afeto é científico: ao consumar o afeto, o cérebro recompensa o corpo por meio da liberação de impulsos químicos que trazem a sensação de prazer e de alegria. Ser afetivo não é ser adocicado. Ser afetivo é trabalhar com as qualidades as emoções, os interesses e os sonhos. Homem algum vive sem sonhos, pois eles despertam ações.
Em sala de aula, em termos práticos, é trazer para o campo das atividades pedagógicas o interesse e o amor dos atores da escola. Um aluno que ama aprender aprende melhor; um professor que ama ensinar ensina melhor. Porém, não podemos nos iludir achando que basta amar para ser bom professor. Antes, se eu amo, eu estudo, eu pesquiso, eu trabalho e, desta forma, adquiro instrumentos mediadores essenciais ao exercício docente. A carga de amorosidade que está em mim me faz ser um aprendiz do saber para exercer com equidade o meu ofício. A carga de amor que está em mim me faz interessado e responsável para descobrir alternativas nos processos de ensino e aprendizagem. Igualmente, a carga afetiva do aluno o faz irromper a lugares ainda desconhecidos de aprendizagem e saber.
Se não podemos ser afetivos sem adquirir os predicados necessários ao exercício docente, tampouco podemos exercer a prática pedagógica sem os atributos do amor. O que torna o homem feliz é o que ele possui de qualitativo, que outorga valor inestimável a coisas frugais e cotidianas. E sua maior expressão é o amor. O prazer e a vida estão no interior do homem. Por isso, desejo mais justo não há: o de ser feliz.
Quando pensamos em educação, há uma troca que se fundamenta no desejo. O afeto está ligado ao desejo, que surge de uma falta, de uma necessidade. A justa e estreme necessidade de completamento. É para tal que nascemos. Educadores, inevitavelmente, devem ser professores das matérias inerentes a esse princípio indelével da raça humana.
Então, como funcionam os mecanismos afetivos em sala de aula? Primeiramente, é preciso considerar que todo o aluno precisa ser amado, aceito, acolhido. Isso já é uma ação pedagógica. Em segundo lugar, ele precisa ainda ser ouvido, compreendido em seus desejos e curiosidades epistemológicas, que precisam ser estimuladas.
Um terceiro aspecto é a percepção objetiva do nível de desenvolvimento do aluno; seu andamento específico, seu ritmo de aprendizagem. Um quarto fator é o tempo de trabalho nas atividades pedagógicas que poderá ser mediado pelo afeto. Quanto mais o aluno se interessar pela atividade, maior será o tempo depreendido nela.
Podemos afirmar, então, que o afeto possui três dimensões: a pessoal, que desenvolve a autoestima do aluno, revelando as raízes da motivação e do interesse; a social, que estabelece as relações com aqueles que estão no campo escolar e que podem tornar o ambiente estimulante para a aprendizagem, pulsando vida, num espaço de expressão e de experimentação; e, por fim, a dimensão pedagógica, que cria e mantém os vínculos do aluno com o objeto de estudo, possibilitando afinidade com o processo de ensino e aprendizagem.
Com efeito, a partir do princípio afetivo da atividade pedagógica, o professor encontrará recursos para o seu trabalho em sala de aula. Não se trata de uma regra, mas de um caminho, pois o afeto traz o interesse para os movimentos de ensino e aprendizagem. Quais atividades o aluno gosta de fazer? Como utilizá-las para desenvolver sua aprendizagem? São perguntas que irão ser respondidas nesse percurso.
Ademais, na educação há a possibilidade de uma formação considerando a função social e construtivista da escola. Entretanto, o ensino dos conteúdos escolares não precisa estar centrado nas funções formais e nos limites pré-estabelecidos pelo currículo escolar. Afinal, a escola necessita aprender a se relacionar com a realidade do aprendente. Nessa relação, quem primeiro aprende é o professor e quem primeiro ensina é o aluno. O afeto é um potencial mediador dessa aprendizagem.
Sugestões de atividades:
  • Jogos diversos, principalmente aqueles que trabalhem linguagem, matemática e conhecimentos gerais;
  • Jogos e atividades que utilizem novas tecnologias digitais;
  • Trabalhos individuais e em grupo envolvendo, por exemplo, música, pintura e desenho;
  • Atividades esportivas individuais e coletivas;
  • Pesquisas em distintas áreas do conhecimento sobre temas que o educando tem interesse;
  • Atividades pedagógicas em que o aluno possa compartilhar com a turma o seu saber.
É bom ressalvar que tão importante quanto propiciar as atividades é observar como o aluno se comporta diante delas. Decerto, as tarefas na escola poderão ter conceitos objetivos e subjetivos para que o aluno aprenda de forma direta e indireta, desenvolvendo distintas áreas do conhecimento.

João OliveiraEugênio Cunha - Doutorando e mestre em educação, psicopedagogo, jornalista, palestrante, pesquisador do GRUPPE/UFF/CNPq, professor do Sistema Montessori e da Faculdade Cenecista de Itaboraí. Autor dos livros: “Afeto e aprendizagem”, “Autismo e inclusão”, “Afetividade na prática pedagógica” e 'Práticas pedagógicas para inclusão e diversidade', publicados pela WAK Editora.
Site: http://www.eugeniocunha.com

A ESCOLA DO MEUS SONHOS

Na escola dos meus sonhos, os alunos aprendem a cozinhar, costurar, consertar eletrodomésticos. A fazer pequenos reparos de eletricidade e de instalações hidráulicas. A conhecer mecânica de automóveis e de geladeira e algo de construção civil. Trabalham em horta, marcenaria e oficina de escultura, desenho, pintura e música no coro e tocam na orquestra.
Uma semana ao ano integram–se na cidade, ao trabalho de lixeiros, enfermeiros, carteiros, guardas de trânsito, policiais, repórteres, feirantes e cozinheiros profissionais. Assim aprendem como a cidade se articula por baixo, mergulhando em suas conexões subterrâneas que na superfície, nos asseguram limpeza urbana, socorro saúde, segurança, informação e alimentação.
Não há temas tabus. Todas as situações-limite de vida são tratadas com abertura e profundidade: dor, perda, falência, parto, morte, enfermidade, sexualidade e espiritualidade. Ali os alunos aprendem o texto dentro do contexto: a Matemática busca exemplos na construção dos precatórios e nos leilões das privatizações; a Língua Portuguesa, na fala dos apresentadores de TV e nos textos de jornais ; a Geografia nos suplementos de turismo e nos conflitos internacionais; a Física nas corridas de Fórmula I- e nas pesquisas do supertelescópio Huble; a Química na qualidade dos cosméticos e na culinária; a História na violência de policiais contra cidadãos, para mostrar os antecedentes na relação colonizadores-índios, senhores-escravos, exército-canudo,etc.
Na escola dos meus sonhos, a interdisciplinaridade permite que os professores de Biologia e Educação Física se complementem: a multidisciplinaridade faz com que a História do livro seja estudada a partir da análise de textos bíblicos; a transdisciplinaridade introduz aulas de dança e meditação e associa a história de arte à história das ideologias e das expressões litúrgicas.
Se a escola for laica, o ensino religioso é plural: o rabino do judaísmo; o pai de santo do candomblé; o padre do catolicismo; o médium do espiritismo, o pastor do protestantismo, o guru do budismo, etc. Se for católica, há periódicos retiros espirituais e adequações do currículo litúrgico da igreja.
Na escola dos meus sonhos, os professores são obrigados a fazer periódicos treinamentos e cursos de capacitação e só são admitidos se, além da competência, comungam os princípios fundamentais da proposta pedagógica e didática, porque é escola com ideologia, visão de mundo e perfil definido do que sejam democracia e cidadania. Essa escola não forma consumidores, mas cidadãos.
Ela não briga com a TV, mas leva-a para a sala de aula. São exibidos vídeos de anúncios e programas e, em seguida, analisados criticamente. A publicidade do iogurte é debatida; o produto, adquirido: sua química analisada e comparada com a fórmula declarada pelo fabricante; a incompatibilidade, denunciadas, bem como os fatores porventura nocivos á saúde. O programa de auditório de Domingo é destrinchado: a proposta de vida subjacente, a visão de felicidade, a relação animador-platéia, os tabus e preconceitos reforçados etc. Em suma, não se fecham os olhos à realidade, muda-se a ótica de encará-la.
Há integração entre escola, família e escola. A política com P maiúsculo, é disciplina obrigatória. As eleições para o grêmio ou auditório estudantil são levadas a sério e, um mês por ano, setores não vitais da instituição são administrados pelos próprios alunos. Os políticos e candidatos são convidados para debates e seus discursos, analisados e comparados às suas práticas.
Não há provas baseadas no prodígio de memória nem na sorte da múltipla escolha. Como fazia meu velho mestre Geraldo França Lima, professor de História ( hoje romancista e membro da Academia Brasileira de Letras), no dia da prova sobre Independência do Brasil os alunos traziam para a classe a bibliografia pertinente e, dadas as questões, consultavam os textos, aprendendo a pesquisar.
Não há coincidência entre o calendário e o currículo. João pode cursar a 5a série em seis meses ou em seis anos, dependendo de sua disponibilidade, aptidão e recursos.
É mais importante educar do que instruir, formar pessoas que profissionais: ensinar a mudar o mundo que ascender à elite. Dentro de uma concepção holística, ali a ecologia vai do meio ambiente aos cuidados com a nossa unidade corpo- espírito e o enfoque curricular estabelece conexões com o noticiário da mídia.
Na escola dos meus sonhos, os professores são bem pagos e não precisam pular de colégio em colégio para poder se manter. Pois é a escola de uma sociedade em que a educação não é privilégio, mas direito universal, e o acesso a ela deve ser obrigatório.